Folhetinesco, A Golondrina cativa quando aposta em registros delicados

Tânia Bondezan e Luciano Andrey em A Golondrina

Em 2016, a cidade de Orlando, na Flórida (EUA), entrou para os destaques do noticiário graças ao ataque terrorista na boate Pulse, frequentada majoritariamente pelo público LGBT+. O atentado ganhou contornos homofóbicos, principalmente por acontecer poucos dias antes da Parada do Orgulho LGBT, vitimando em torno de 50 pessoas. 

O episódio não apenas reacendeu a discussão acerca da homofobia, mas também abriu os olhos do mundo para uma necessidade de atenção e proteção através de políticas públicas para essa parcela da sociedade. 

Foi em meio a esse cenário e discussão que surgiu A Golondrina, peça do dramaturgo espanhol Guillem Clua, que estreou em 2017 na cidade de Londres, um ano após o ataque. Na obra, Clua põe frente a frente duas personagens diretamente ligadas ao ocorrido em texto de tom folhetinesco, tratando de uma temática atual com moldes de um drama clássico.

Ora em cartaz no Teatro Nair Belo, dentro do shopping Frei Caneca, a versão brasileira para A Golondrina busca dosar os signos folhetinescos através de uma encenação delicada que, embora não se prive do drama causado pelo atentado, não se vale apenas dele como meio de atingir a plateia. 

Mérito do diretor Gabriel Fontes Paiva, que resiste a enação de apelar para uma montagem altamente emocional, escapando da armadilha de criar personagens maniqueístas baseadas no calor de uma discussão ainda bastante inflamada sobre os direitos dos homossexuais na sociedade contemporânea. 

Na pele da exigente professora de canto Amélia, Tânia Bondezan constrói uma personagem repleta de nuances, fugindo da enação de fazer com que ela pareça uma simples vilã. Unindo técnica irrepreensível a uma emoção bem dosada, Bondezan faz dessa montagem um de seus melhores trabalhos, assim como seu companheiro de cena, Luciano Andrey. 

Embora renda menos na comparação com sua colega, Andrey consegue um registro diferente daquele que o consagrou como um requisitado ator no meio do teatro musical brasileiro. Fugindo a opulência que o gênero pede, Andrey também utiliza seu talento como intérprete para dar voz a duas bonitas canções – a que intitula a peça, a mais significativa, que cresce quando o ator recebe o apoio vocal de Bondezan, surpreendentemente cantando muito bem. 

Auxiliados pelo (belo) cenário de Fábio Namatame, e pela excelente luz de André Prado, os atores constroem uma ligação com a plateia que dribla algumas irregularidades do texto, traduzido com igual irregularidade por Bondezan, que, detalhista, mimetiza o toque do piano a perfeição. 

Sob o comando de Paiva, a dupla encontra um caminho de resultado bonito, embora não resista a um desfecho edificante. Mas, apesar do lugar comum, é impossível diminuir o resultado alcançado pela encenação que, no tempo da delicadeza, conseguiu contornar os perigos de fazer de A Golondrina um trágico drama clássico, e conseguiu suavizar a encenação, engrandecendo não apenas o elenco, mas também a obra de Guillem Clua.

SERVIÇO: 
A Golondrina 
Data: 19 de abril a 09 de junho (sexta a domingo) 
Local: Teatro Nair Belo – São Paulo (SP) 
Endereço: Rua Frei Caneca, 569 – 401A – Consolação (Shopping Frei Caneca) 
Horário: 21h (sextas e sábados); 19h (domingos) 
Preço do ingresso: R$ 60 (inteira) e R$30 (meia)

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