Esmaecida, A Cobradora se perde em encenação frágil e dramaturgia irregular

A Cobradora | Foto: Christiane Forcinito

Ao se propor a encenar uma série de depoimentos sobre temas específicos, companhias e diretores geralmente optam por registros dramáticos que, mesmo costurados com alguma comicidade, trazem relatos de situações limite, seja em tragédias, como em Hotel Mariana (2017), situações de reflexão como em Projeto Revide (2019), ou casos de dramas pessoais potencializados pelo coletivo, como em Eu Sempre Soube (2019), apenas para citar três exemplos dos últimos anos.

A Cobradora, obra da Zózima Trupe ora em cartaz no Auditório do Sesc Vila Mariana segue pelo mesmo caminho. Unidos pela dramaturgia de Claudia Barral, os depoimentos de mulheres que trabalham como cobradoras nos ônibus das linhas do Terminal Parque Dom Pedro II, na zona central da capital, norteiam a encenação da Zózima Trupe, grupo teatral que construiu linguagem própria ao transferir o ato cênico justamente para os ônibus da capital.

Em sua primeira investida cênica num ambiente teatral, a Zózima Trupe apresenta um espetáculo que bebe justamente na fonte da qual se celebrizaram. Protagonizado por Maria Alencar, o espetáculo busca unir os depoimentos profissionais e pessoais das cobradoras a figura bíblica de mulheres como Lilith e Eva, num grande tratado sobre a figura e a força feminina.

Contudo, a despeito da ótima premissa, A Cobradora é espetáculo mais esmaecido do que sua proposta faz supor. Excelente dramaturga, Cláudia Barral, que já assinou trabalhos como o clássico Cordel do Amor sem Fim, soa pueril com um texto direto, que parece pouco desenvolvido. Mesmo nos momentos em que ameaça certa poética, esbarra num trivialismo que faz com que a ação não se desenvolva.

A direção de Anderson Maurício até ameaça construir uma linha narrativa, mas também parece se perder, mesmo quando propõe interessantes quadros cênicos, como, e principalmente, a abertura representando a evolução social da figura feminina. Os depoimentos coletados, apesar de oscilantes, resultam como os pontos mais interessantes de toda a encenação, que conta com bom cenário desenvolvido pelo diretor com Nathália Campos, favorecido pelo excelente projeto de vídeo mapping de Leonardo Souzza e Otávio Rodrigues.

Estrelando o monólogo, Maria Alencar apresenta interpretação monocórdia trabalhada no mesmo registro cênico. Sem delicadezas, a atriz constrói uma personagem tão trivial quanto o texto que costura os depoimentos, num registro que, ao longo de (excessivos) 90 minutos soa exaustivo.

Quando desce a plateia, num movimento que faz ressoar as raízes da companhia, Alencar tenta buscar uma cumplicidade de um público que jamais chega, mostrando que, a despeito da ótima premissa, alguma coisa está fora de ordem em A Cobradora, o esmaecido espetáculo que mostra que a Zózima Trupe ainda guarda vícios do teatro no transporte público que não funcionam no palco.

Notícias relacionadas