Ana Beatriz Nogueira propõe manutenção do jogo cênico em mergulho na solidão existencial de Lispector

Ana Beatriz Nogueira em cena em Um Dia a Menos | Foto: Cristina Granato

Quando estreou, em 2019, na esteira da celebração de seus 35 anos de trajetória artística, o solo Um Dia a Menos, Ana Beatriz Nogueira subiu ao palco do Teatro PetraGold, no Rio de Janeiro, com obra em que caminhava por caminhos cênicos já conhecidos.

 A montagem, baseada em texto homônimo de Clarice Lispector (1920-1977), adaptado e dirigido por Leonardo Netto, se estruturava nas mesmas bases que o solo anterior da artista, Tudo o que eu Queria te Dizer (2010), baseado no livro homônimo editado por Martha Medeiros em 2007 com cartas fictícias que descortinavam relações conflituosas.

Sob a direção de Victor Garcia Peralta, o solo era estruturado de forma simples, tendo como principal foco o trabalho da artista e sua conexão com o público, surgida, inegavelmente, de seus trabalhos na TV, mas mantida pelo carisma e excelente jogo de cena que a artista sempre propôs em suas investidas cênicas.

É essa mesma simplicidade que adorna Um Dia a Menos, em cartaz em São Paulo desde o dia 06 de novembro, sábado, no palco do Teatro Renaissance, nos Jardins. A estrutura narrativa, o cenário minimalista ao extremo (uma poltrona simples, uma taça de água e um telefone) e o trabalho da atriz conectam esta obra à montagem baseada no livro de Medeiros.

Ainda que em universos diferentes, as duas produções estabelecem diálogos que fazem com que Um Dia a Menos, ainda que ótimo exercício cênico, soe como uma manutenção da proposta da obra anterior. Nogueira mergulha na melancolia do texto – um dos últimos publicados pela escritora de ascendência ucraniana e criação pernambucana – sem muletas, confiando no (bem sucedido) diálogo direto com o público.

A direção de Leonardo Netto oferece caminhos para que a plateia embarque na narrativa sem o perigo de qualquer ranço monótono. A história da mulher tomada de tédio em um apartamento vazio caminha a seu próprio tempo sem se deixar levar pelo caráter de urgência do teatro contemporâneo.

Nogueira mergulha na discussão profunda e existencialista de Lispector, ressignificada pela pandemia, sem que a crise sanitária jamais surta qualquer efeito dramatúrgico direto.

Tudo na obra converge para que as atenções se voltem à (excelente) intérprete, que consegue manter o interesse pulsante acerca de uma personagem de vida (a priori) desinteressante, até seu desfecho, a rigor, previsível.

Ainda que não ofereça grandes novidades, Um Dia a Menos é bom exercício cênico em que Ana Beatriz Nogueira volta a se pôr em risco em espetáculo que (da luz de Aurélio Simone, passando pelo figurino de Kika Lopes e a direção de Netto) presa pelo minimalismo cênico e pelo diálogo direto com o público sem subterfúgios, tendo como base um bom texto e uma grande intérprete.

SERVIÇO:

Data: 06 a 28 de novembro (sábados e domingos)

Local: Teatro Renaissance – São Paulo (SP)

Endereço: Alameda Santos, 223 – Jardins

Horário: 17h30 (sábados); 20h30 (domingos)

Preço do ingresso: R$ 35,00 (meia) a R$ 70,00 (inteira)

Notícias relacionadas