Encontro de Rabelo e Rosseto é força motora que mantém solo sobre prostituição pulsando interessante

Doralice Senhora Meretriz - Foto: Luiz Mota

Autor que há quase uma década vem desenvolvendo dramaturgia com base na investigação do universo marginal da condição humana, Dan Rosseto estreou no dia 20 de novembro no digital sem fugir a essa premissa e linguagem que lhe rendeu títulos como o seminal Manual para Dias Chuvosos (2014), Antes de Tudo (2015), Enquanto as Crianças Dormem (2017), Diga que Você já me Esqueceu (2018) e o incensado Nunca Fomos tão Felizes (2019), entre outros.

Passeando pelo universo do meretrício, Doralice – Senhora Meretriz é obra menos ambiciosa o repertório do dramaturgo paulista. No espetáculo, que cumpre temporada online apenas até a próxima sexta-feira, 04, com transmissão diretamente do Viga Espaço Cênico, em São Paulo, o autor propõe um diálogo da personagem com a plateia numa espécie de palestra sobre o ofício desempenhado há meio século.

Protagonizado por Glória Rabello, o espetáculo peca quando não propõe explorar as possibilidades de uma transmissão online, ganhando contornos mais frios e, a despeito dos cortes de câmera e do uso de diferentes ângulos, cambaleia pendendo mais para uma peça filmada do que necessariamente para uma experiência cênica digital, ou mesmo um híbrido com a linguagem cinematográfica.

A obra se equilibra, contudo, nas armadilhas do teatro transmitido online graças a figura de Rabello, atriz de registros delicados e associada a peças como a interiorana Histórias que eu não Inventei (2002) e a familiar Entre! A Porta Está Aberta (2018). Em Doralice, a atriz de (inacreditáveis) 70 anos se põe a beira do abismo em interpretação longe da zona de conforto, promovendo bonita interação com o texto de Rosseto.

É justamente esse encontro entre a dramaturgia do autor e a força desta atriz que, em plena pandemia, abandonou o isolamento para se jogar numa história menos cômoda, que faz de Doralice – Senhora Meretriz obra relevante no frigir dos ovos e impede que soe como mera obra protocolar destes dois artistas e universos tão distintos, embora constantemente alinhados.

Não tivesse uma pandemia de um vírus pulmonar congelado o mercado cultural e impedido a aglomeração de público em plateias teatrais, certamente não haveria frieza prejudicial para produção que, apesar dos pesares, cresce graças a força cênica (que nunca seca) do encontro entre Glória Rabelo e Dan Rosseto.

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