Gaveta D’Água levanta, com delicadeza, discussões e reflexões, mas não cativa

Gaveta D Agua | Foto: Laysa Alencar

País em que é registrada uma morte por homofobia a cada 16 horas, o Brasil ocupa o primeiro lugar no ranking de nações onde mais se matam homossexuais em todo o mundo. Refletindo estes dados, o teatro sempre buscou catalisar esta problemática para discuti-la e, assim, promover o combate aos crimes de ódio e intolerância que marcam o país desde sempre, e que parecem ter se intensificado no último século.

Gaveta D’Água, primeiro solo do ator santista Silvio Eduardo, em cartaz no Espaço Satyros 1, na Praça Franklin Roosevelt, zona central da capital, desde a noite de ontem, 25, engrossa a lista de espetáculos em busca de uma discussão e um enfrentamento frente a esta realidade.

Na obra, primeiro texto solo da dramaturga Nina Nóbile, Eduardo vive um homem vítima de ataques homofóbicos enquanto seguia sua rotina de natação notívaga. Morto por seis “pessoas de bem”, a personagem vive uma espécie de flashback reflexivo e fragmentado sobre sua vida e uma leva desejos e anseios, entre eles, o sonho de se tornar uma sereia.

Sob a direção de Gustavo Ferreira, Gaveta D’Água levanta uma série de questionamentos acerca dos títulos e das restrições sociais que foram os cidadãos dentro de suas próprias “gavetas”, sem que possam transitar entre outras realidades e definições.

Bom ator, Silvio Eduardo passeia com delicadeza pela história de sua personagem, construindo interessante relação com o público e o espaço, valorizado pelo bonito cenário assinado por Cinthia Cardoso, construindo sob as emoções sublinhadas à meia-luz pensada por Elisa Barboza.

Entretanto, alguma coisa parece estar fora de ordem neste solo da paixão. O texto assinado por Nina Nóbile, embora persiga uma linguagem poética flerta com certo trivialismo acentuado pelas fragmentações propostas pela autora e pela direção de Gustavo Ferreira, que constrói bonita encenação, mas jamais atenua o tom de irregularidade e uma fórmula tato dramatúrgica quanto cênica que carece de reinvenção.

Produzido pela Cia. Os Satyros, Gaveta D’Água aponta para uma fórmula exaustivamente usada, por meios de uma dramaturgia fragmentada em cenas que perseguem um tom de certa poesia teatral – ainda que não a atinja de fato. Direção e dramaturgia não reciclam a fórmula dando a entender que a encenação, a despeito de ambiciosa, resulta trivial.

Em cartaz todas as quintas-feiras às 21h, até o dia 26 de setembro, Gaveta D’Água é um bom solo de exercício para discussão sob o bom desempenho de Silvio Eduardo – justiça seja feita, bem guiado por Ferreira -, mas aponta para uma necessidade de renovação da linguagem proposta pelo grupo Os Satyros que, diferente de espetáculos anteriores, ainda que não se superassem, encontravam o ponto para cativar.

SERVIÇO:

Data: 25 de julho a 26 de setembro (quintas-feiras)

Local: Satyros 1 – São Paulo (SP)

Endereço: Praça Franklin Roosevelt, 214 – Consolação

Horário: 21h

Preço do ingresso: R$ 15,00 (meia) a R$ 30,00 (inteira)

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