Maitê Proença desconstrói dogmas teatrais em corajoso e doído solo de paixões

O Pior de Mim - Foto: Divulgação

Em 2005, ao entrar em cena ao lado da amiga e parceira de cena Clarice Derzié Luz na comédia dramática Achadas e Perdidas, adaptação teatral de seu primeiro livro, Entre Ossos e a Escrita (2004), Maitê Proença dava os primeiros passos na construção de uma obra dramatúrgica que ganhou corpo em 2009, com a montagem de As Meninas (adaptação de outro livro, Uma Vida Inventada, de 2008), e atingiu seu ápice com a montagem de À Beira do Abismo me Cresceram Asas (2013).

Nenhum título, entretanto, atingiu o grau de relevância de O Pior de Mim, melhor título da obra dramatúrgica da atriz multimídia, e que segue em cartaz ao longo de novembro de 2020 em temporada prorrogada no Teatro PetraGold, no Leblon, zona sul do Rio de Janeiro. Sob a direção de Rodrigo Portella, Proença realiza autoanálise íntima e doída sob o olhar do público em sessões transmitidas via streaming.

Gênero cada vez mais em ascensão no teatro brasileiro, a autoficção contudo ganha novos contornos em O Pior de Mim. Sem apelar para muletas pretensamente poéticas, a artista abre o jogo numa conversa franca com o público em peça construída na estrutura de uma crônica cênica que expõe dores, demônios e paixões de uma vida marcada por perdas trágicas.

É com base nestas perdas que Proença analisa, por exemplo, seu desempenho como atriz numa exposição corajosa, na qual se coloca no papel de uma artista que, embora tenha construído carreira sólida e respeitada, sente que poderia ter ido mais afundo não apenas em suas construções, mas também na ação de contestar concepções equivocadas ou decisões pretensa ou (até) sádicas de diretores ao longo de sua trajetória.

Desenvolvido como um grande papo da atriz com o público, O Pior de Mim dá passo à frente nas investigações da dramaturgia autobiográfica e, principalmente, no que diz respeito a encenação. Devota da linguagem direta desenvolvida pelo método de encenação de Amir Haddad, Proença se permite abrir mão de dogmas teatrais que, não raro, criam ruídos irregulares em trabalhos do gênero.

Neste sentido, a encenação pensada por Rodrigo Portella soa (até) excessiva ao colocar a artista em movimento intenso para criar desnecessária impressão de intimidade com a plateia virtual emulando um jogo “olho no olho”. Proença, contudo, é atriz que sabe utilizar do carisma para driblar a frieza do streaming e fugir às armadilhas do teatro filmado. A construção do texto dá conta de criar a intimidade com o público.

O fato é que tanto a dramaturgia quanto a disponibilidade de se pôr à prova já tiram Proença de uma possível zona de conforto e fazem de O Pior de Mim não apenas um corajoso solo de paixões de análises sobre a vida e a trajetória de Maitê Proença, mas também, e principalmente, apresenta um passo à frente nos projetos de autoficção, dando caminhos para aproximar o público sem jamais subestimá-lo.

SERVIÇO:

O Pior de Mim

Data: 02 de outubro a 27 de novembro (sextas-feiras)

Local: Teatro Petra Gold – Rio de Janeiro (RJ)

Horário: 20h

Preço do ingresso: R$ 25,00 (meia) a R$ 50,00 (inteira)

Espetáculo transmitido via streaming até o dia 30 de outubro e com a presença do público a partir de 06 de novembro.

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