Neblina propõe mergulho na complexidade do luto ao conservar dinâmica do jogo teatral

Neblina | Foto: Guto Muniz

À primeira vista, não é difícil analisar Neblina, espetáculo que chegou ao palco do Centro Cultural do Banco do Brasil, em São Paulo, mais de um ano após ter estreado no CCBB de Minas Gerais e ver sua temporada bruscamente interrompida pela Covid-19, como um mero drama familiar que se propõe a thriller como meio de manter viva a atenção de sua plateia.

Entretanto, a montagem, com texto de Sérgio Roveri e direção de Yara de Novaes, é obra que se aprofunda muito mais na complexidade do luto e no jogo cênico do que necessariamente num drama ou num thriller existencial (searas por onde passeia com a mesma fluidez).

Embora se estabeleça como (bom) suspense em seu primeiro momento, o espetáculo se desenvolve como um exercício teatral a sua dupla de atores, que, em cena, dão vida a duas personagens que se veem em situações limites – uma precisa de ajuda após seu carro ter quebrado no meio de uma estrada distante, e outro precisa decidir se abre a porta de sua casa para uma estranha no meio da noite.

A partir desta primeira camada, Fafá Rennó e Leonardo Fernandes estabelecem duelo no qual prestam tributo à construção de personagens clássicas em dramas existenciais que funcionaram como bastiões da dramaturgia ocidental do século XX, entre eles títulos de nomes como Edward Albee (1928-2016), Tennessee Williams (1911-1983) e Eugene O’Neill (1888-1953), apenas para citar três.

Contudo, ao longo de (enxuta) uma hora, Neblina se desenvolve como obra misteriosa que engaja muito mais o público do que necessariamente o elenco em um jogo que se propõe a desvendar as complexidades do luto de um casal que buscou na dinâmica do teatro uma forma de superar uma grande perda.

A direção de Yara de Novaes sublinha esse caráter quase mítico da obra ao estabelecer um contato constante da ação presente com um passado por meio de inserções de áudio que, se nem sempre fazem a história caminhar, adicionam camadas que auxiliam no diálogo do público com o elenco.

Em cena, Fafá Rennó e Leonardo Fernandes constroem cumplicidade que faz de Neblina um duelo de dois titãs. A dupla constrói personagens alicerçados em registros delicados. Ainda que Fernandes tenha um trabalho de corpo com mais visibilidade, Rennó embarca em duas personagens construídas com base no olhar.

A encenação de Novaes constrói diálogo fluido entre o (ótimo) desenho de luz de Wagner Antônio, a trilha de Dr Morris e o cenário minimalista e claustrofóbico pensado por André Cortez, que resultam em obra pulsante que valoriza, no fim, o mais puro jogo teatral.

SERVIÇO

Data: 12 de novembro a 23 de janeiro (sexta-feira a domingo)

Local: Centro Cultural do Banco do Brasil – São Paulo (SP)

Endereço: Rua Álvares Penteado, 112 – Centro Histórico

Horário: 18h30 (sexta-feira); 17h (sábado e domingo)

Preço do ingresso: R$ 15,00 (meia) a R$ 30,00 (inteira)

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