Thiago Mendonça vira a mesa do jogo teatral em Stonewall 50, espetáculo feito em tom de resistência artesanal

Stonewall 50 | Foto: Edson Lopes Jr.

Foi em 2006 que, aos 25 anos de idade, o ator Thiago Mendonça encontrou com Renato Farias, ator e diretor carioca, e se juntou a Cia. Teatro Íntimo, fundada um ano antes e, juntos, encenaram Veridiana e Eu, peça de Tarcísio Lara Puiati que estreou no Festival de Curitiba e catapultou Mendonça para o elenco de Duas Caras, noveladas 21h de Aguinaldo Silva, exibida pela Rede Globo no ano seguinte.

Treze anos após o início desta parceria, Mendonça, então já acolhido pela comunidade teatral formada pela Cia. Os Satyros, na Praça Franklin Roosevelt, celebra não apenas sua parceria com a companhia formada por Farias, como também saúda personalidades como as atrizes Phédra de Córdoba e Márcia Dailyn em Stonewall 50, peça que estreou na última sexta-feira, 28, a meia noite no espaço Satyros 1.

Sob a direção de Renato Farias, Thiago Mendonça rememora os 50 anos da revolta de Stonewall, considerado marco inicia da batalha pelos direitos civis da comunidade LGBTQI + ao redor do mudo. Em cena, o ator usa da linguagem experimentada há quase quinze anos pelo grupo ao abrir mão dos sinos do teatro convencional.

Mendonça não apenas abdica da linguagem da quarta parede, como também não se limita simplesmente a contar a história que marcou a revolução por busca de respeito e igualdade na comunidade. O ator funde sua própria história de vida a história de resistência iniciada em Stonewall para, assim, traçar paralelos com a realidade sócio-política do Brasil, o país que mais mata o público LGBTQI+ em todo o mundo.

Encenado no momento em que se celebra a criminalização da homofobia, o espetáculo adensa seus contornos políticos quando Mendonça, ator que se celebrizou não apenas por novelas, mas, principalmente, no cinema, nas cinebiografias de Zezé Di Camargo & Luciano (Dois Filhos de Francisco, na pele de Luciano Camargo) e Renato Russo (Somos tão Jovens, na pele do cantor e compositor carioca), põe sua própria homossexualidade em cena para discutir o sexismo e o preconceito que adornam a vida de jovens e crianças desde sempre.

Com cenografia assinada pelo próprio ator, o espetáculo ressoa a delicadeza de uma construção artesanal, quando Mendonça leva ao palco seu acervo de bonecas e bonecos (ou “bonecxs”, como chancela em cena), sem jamais esconder as questões que compuseram os bastidores, como a falta de patrocínio ou as condições de apoiadores para o espetáculo. É o ator desnudando a mágica teatral em plena cena para, depois, reconstruí-la.

Com uma linguagem difícil de categorizar, Mendonça entra em cena já com o jogo ganho, valorizando o espetáculo com um carisma imenso e um jogo de sinceridade com uma plateia que, verdade seja dita, já havia se disposto a abraçar a proposta do ator, fazendo com que mesmo problemas técnicos soassem irrelevantes frente a excelência da forma que envolvem a mensagem e o discurso adotados pelo espetáculo.

A despeito de ser, em suma, um espetáculo leve, a peça também pesa e mergulha num drama catártico que o eleva e fazendo com que escape de qualquer trivialidade na qual pudesse se alicerçar ao longo de 60 minutos de encenação. Ponto para a delicada direção geral de Renato Farias, que constrói, auxiliado ela luz de Tabbatta Martins, quadros de extrema delicadeza e ternura.

Em cartaz no Satyros 1 até 27 de julho, Stonewall 50 é espetáculo construído nos moldes de uma delicadeza artesanal alicerçada em tom de resistência que não se priva de celebrar a figura daqueles que vieram antes – como a terna participação em vídeo da cantora e atriz Divina Valéria – num final que foge a catarse pura e assume o tom artesanal feito em feitio de oração no tempo da delicadeza cênica. É de arrepiar.

SERVIÇO:

Data: 28 de junho a 27 de julho (sextas e sábados)

Local: Satyros 1 – São Paulo (SP)

Endereço: Praça Franklin Roosevelt, 222 – Consolação

Horário: 23h30

Preço do ingresso: R$ 40,00 (inteira) / R$ 20,00 (meia)

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