“Atleta dos palcos”, Jefferson Ferreira explica como funciona a atuação do artista swing nos musicais

Jefferson Ferreira | Foto: Caio Gallucci

O ator deve estar preparado para cada surpresa que possa aparecer em seu caminho. Essas surpresas podem, muitas vezes, ser aquele papel tão desejado ou até, em alguns casos, mais de um papel na mesma peça, o que se acaba se tornando uma completa maratona para este artista. 

Contudo, este desafio é encarado de bom grado por Jefferson Ferreira, carioca, bacharel em Estatística pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), profissional de Tecnologia da Informação pela Fundação Centro Universitário da Zona Oeste do Rio de Janeiro (UEZO), também Dançarino com DRT pelo Sindicato dos Profissionais de Dança do Rio de Janeiro (SPDRJ), graduado em Ballet Clássico e Jazz Dance pela Patrícia Estevez Escola de Dança, e que atualmente pode ser visto no elenco de Barnum – O Rei do Show, em cartaz em São Paulo. 

Na função de swing – termo técnico no teatro musical para o profissional preparado para qualquer eventual substituição no ensemble – Jefferson fez da sua versatilidade no palco e na vida sua principal força para entrar no teatro musical. Nesta função, o artista deve estar pronto para memorizar falas, marcações, construções de personagens, passos de dança, entre outros elementos além daqueles destinados a serem compartilhados com mais de um ator no elenco. 

No caso de Barnum, este elemento novo foi o circo, eixo temático por onde gira a dramaturgia da obra que tem sua primeira montagem no Brasil desde a estreia na Broadway em 1980 e é estrelado por Murilo Rosa no papel título e Kiara Sasso, nome amplamente conhecido no teatro musical brasileiro. 

Eu acho que existe um diferencial nessa função que não pode ser executada por qualquer pessoa. Não pelo talento do artista, mas pelo perfil que ele tem. A carreira como swing me fez abrir meu leque artístico. Em uma mesma produção existem vários tipos de personagens interpretados por atores com diferentes linguagens e com bases artísticas distintas, principalmente se for um tipo de musical onde a dança (ou uma habilidade específica como o sapateado, ou mesmo o circo) é utilizada. Isso acaba exigindo ainda mais dos swings da peça que deverão estar utilizando todas as suas facetas artísticas para as devidas substituições. E quando não se tem uma experiência em uma área específica (como no caso do circo em Barnum), é sempre válido se dedicar em aprender algo novo, isso enriquece ainda mais o artista” explica Ferreira. 

Experiência com Miguel Falabella, Claudia Raia e Marília Pêra

Em Barnum não é a primeira vez que Jefferson integra o elenco de um musical. Sua estreia no teatro musical foi em 2012, na remontagem de outro clássico da Broadway no Brasil: Alô, Dolly!, estrelado por Miguel Falabella e a saudosa Marília Pêra nos papéis principais. 

Tive de tomar uma decisão onde eu estaria apostando todas as fichas em algo totalmente desconhecido. Em Botafogo, no Rio de Janeiro, próximo ao escritório da Oi Telecom onde eu trabalhava como estatístico, vi um outdoor que me chamou muita atenção. Ele anunciava audições para um novo musical do Miguel e Marília  em que precisavam de bailarinos clássicos para compor o elenco. Imediatamente pedi a liberação do meu chefe para participar das audições. 

Não fui autorizado a tirar folga para a grande final que seria em dois dias no Teatro Procópio Ferreira em São Paulo na época. Foi então que tive que pedir demissão de um trabalho totalmente estável, em uma empresa privada, na minha área de formação, onde eu já tinha o cargo de analista de projetos, para uma simples possibilidade de 50% de chance, pois naquele momento ainda éramos oito bailarinos para quatro vagas, em num musical” relembra Jefferson

Depois de Alô, Dolly!, outras montagens de clássicos também entraram na carreira de Jefferson, que pela experiência já adquirida em “Dolly”, acabou passando para o elenco de Crazy For You, montado e protagonizado no Brasil por Claudia Raia e Jarbas Homem de Mello ao final de 2013. Em pouco tempo, o ator acumulou a experiência de trabalhar com grandes nomes do teatro musical brasileiro que marcaram a novo momento do gênero no país.

Eu me sinto absolutamente honrado, e não por causa da fama deles ou pelo o que eles representam na nossa classe, mas sim pelos ensinamentos, por ter podido compartilhar momentos especiais, por poder ter assistido a performance deles por tanto tempo da coxia (no intervalo entre as cenas que eu fazia). Enfim, foi um ciclo de aprendizagem muito importante que construiu o início da minha carreira profissional, fora todo o carinho que recebi deles durante esse período”, celebra o artista ao relembrar estas produções que abriram o caminho para ele nesta habilidade específica que é a atividade do swing no teatro musical.

Tarefa árdua realizada com amor

Tendo se graduado em duas faculdades – ao mesmo tempo em que cursava Dança -,  Jefferson teve desde cedo estabelecer métodos e rotinas para cumprir com todas as atividades. Hoje, o ator ocupa pela segunda vez em sua carreira o cargo de swing em um musical e reconhece a responsabilidade deste elemento para que a produção aconteça da melhor maneira possível no palco.

No meu processo, a primeira coisa que eu me dedico é à dança. Uma vez aprendido todas as sequências, eu consigo visualizar melhor o que cada um faz e suas diferenças dentro de um mesmo número. Para as marcações de palco, eu utilizo o incrível aplicativo ‘Stage Write’, criado por Jeff Whiting (que inclusive coreografou nossa versão do Crazy For You). O app me permite destacar o que cada ator faz em cada cena (e seus movimentos) de uma forma organizada e sequencial. A partir daí, creio que o foco é assistir bastante a peça e seguir um único ator a cada vez, principalmente se eu já sei qual será o possível próximo ator a ser substituído.” explica o artista sobre sua disciplina para manter em ordem suas atribuições.

Com a prática e frequência, Jefferson explica que a cada substituição, fica mais fácil memorizar as atividades e intenções dos outros atores quando ele precisa eventualmente substituí-los. “Ao contrário de alguns artistas, eu absolutamente amo essa função. Eu tive que pular etapas rapidamente no mundo da dança e estar atento a tudo à minha volta para que eu pudesse crescer como profissional. Acho que o papel de cobrir atores tem tudo a ver comigo. É desafiador, é inconstante, é visceral”, destaca Jefferson sobre esse tipo de atuação.

Dançando além mar

A dança também foi responsável por levar Jefferson para além dos palcos brasileiros. Literalmente. Além dos musicais que se somam em sua carreira, que inclui ainda o jukebox “We Will Rock You”, com músicas da banda Queen e encenado no Brasil em 2016, o ator está em preparativos para retomar sua segunda atividade profissional favorita: se apresentar em shows de cruzeiros internacionais.

Dançar sempre foi e será a minha base, o motivo por eu ter me encantado pela Arte de uma maneira geral e o início do caminho que me fez virar o ‘artista completo’ de hoje. A paixão por essa área me fez mergulhar de cabeça nos meus contratos dentro e fora do Brasil e se tornou a minha mola propulsora para alcançar grandes metas e viajar para lugares incríveis. Seja no início da carreira indo para Joinville ou Córdoba (Argentina) competir em festivais de Dança, seja mais recentemente, antes da pandemia, podendo conhecer quase toda a Austrália, Caribe e Ásia dançando em navios cruzeiros”, explica o dançarino que se prepara para uma nova empreitada entre o Canadá e o Alasca após o término da temporada de “Barnum” no Brasil.  

Antes de fazer as malas, Jefferson faz um balanço sobre como o Brasil ainda tem potencial para dar oportunidades a novos artistas trabalharem como swing, embora tenham que, antes disso, estarem aptos para qualquer situação surpresa. Por conta da necessidade de maior preparo, o artista também explica que a remuneração deste trabalho está acima daquela oferecida aos membros do coro, o que ajuda também o artista a ter mais dinheiro para expandir suas habilidades.
Eu sinto uma aceitação muito boa desse cargo aqui no Brasil. Uma menção interessante foi de quando, ao final da última sessão de ‘Crazy for You’, Claudia Raia fez alguns agradecimentos especiais e então fez questão de chamar os swings ao palco para mencionar a importância desse papel num espetáculo grandioso como esse. Ser swing te faz desenvolver vários pontos novos como artista e desafios que te mantém sempre a postos. Eu sinto que um artista nesse cargo está sempre experimentando o frescor de uma primeira vez e revivendo o friozinho na barriga, que não deveria morrer nunca e que é essencial para o artista”, finaliza o artista.

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