Lula e o Comitê

O pré-candidato à Presidência Luís Inácio Lula da Silva | Foto: Divulgação

Como já era esperado, o ex-presidente e atual candidato Lula (PT) anunciou o retorno no Ministério de Cultura caso vença as eleições. A revelação veio acompanhada da promessa de criação de um comitê, que chega em tom de reforço a retomada da pasta em sua possível volta a liderança do país.

Falar sobre a criação de um comitê na área da cultura para assegurar que a pauta tenha representatividade, e claro, andamento, é quase uma jogada de marketing do PT. Esse PT que sabe muito bem que trata-se de uma das áreas mais bem articuladas da política pública em território nacional, mesmo com tantas adversidades, no mais distante Brasil profundo é possível encontrar resquícios da militância de programas como o Cultura Viva, implantado pela própria gestão PT no início de 2003.

Mas esse tal “comitê” pode ser uma resposta fácil para comunicar com o grande público, parte da massa que não fora contaminada pela política de desmonte que vem acontecendo, e, mais ainda, talvez seja uma maneira de destacar o caráter democrático que a pauta da cultura necessita para que continue existindo. Isso provavelmente foi uma resposta fácil que Lula (que não dá ponto sem nó) deu na coletiva para uma imprensa, que é basicamente creditada a esquerda. Com certeza espera-se muito mais dele, espera-se a retomada dos anos de glória, do discurso bonito e tão reproduzido da posse do então ministro Gilberto Gil.

A história da gestão petista em relação à cultura não é linear, ocupa inclusive lugares de sérias críticas no setor cultural. Grupos e coletivos específicos foram privilegiados, a Rouanet teve três instruções normativas e poucas, ou quase nenhuma, mudança processual (sim, a classe artística anseia há anos por mudanças na Lei Rouanet) e, por último, programas como o Cultura Viva, carro chefe dessa tradução da cultura de base, estiveram bem esquecidos nos últimos anos do mandato Dilma; mas o que não se pode negar é que foi o único governo na história desse país a pensar na cultura no sentido antropológico e no respeito às bases. O discurso, mesmo aquele descolado de um ministério sempre recebedor da menor fatia da união por todos os treze anos, era de resistência, de respeito, de democracia.

Talvez a pergunta não seja por que Lula resolve falar em criar comitês e sim por que só ele fala em fortalecer a cultura. O que se sabe é que falar de cultura em período eleitoral segue sendo tabu, em nenhum dos debates presidenciáveis entre 2014 e 2018 esse tema não foi sequer levantado. Pode ser que seja preciso coragem para falar de algo desde sempre tão distorcido. Ao que tudo indica, resistir pelas artes, desde os bailarinos clássicos até as rendeiras das comunidades ribeirinhas, em 2022, significará acreditar nessa retomada política petista, nem os discursos ciristas, opção clássica da esquerda, são suficientemente claros sobre as necessidades do setor.

Essa tal de cultura, tão desgastada e combatida pelo governo Bolsonaro, aparentemente segue pouco compreendida, não apenas sua importância mas também necessidades. Os anos de governo Lula geraram modelos de projetos a serem seguidos e cabe aos novos possíveis governantes, minimamente letrados, entenderem a importância de olhar para esse retrovisor da história, e aprender com os acertos do passado.

Fato é que a cultura não pertence ao PT, sua história foi construída pelas lutas daqueles que fazem e existem, mesmo quando isso pode ser difícil demais, porém o PT abriu uma porta para que isso se tornasse política e é essa porta que precisa que precisa continuar aberta.

Especialista em Acessibilidade Cultural, Bruna Burkert é atriz, dramaturga e produtora.
Ativista Cultural, amante do teatro de rua e da cultura periférica e inclusiva.

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