Flávio Migliaccio deixa obra teatral de cunho pessoal que merece mais atenção

Flávio Migliaccio - Foto: Marcos Arcoverde

Conhecido nacionalmente como ator de obras televisivas do quilate de Shazan, Xerife & Cia (programa infanto-juvenil exibido em meados da década de 1970), Rainha da Sucata, Caminho das Índias, Tapas & Beijos e Órfãos da Terra, Flávio Migliaccio deixa também obra de peso como dramaturgo.

Embora tenha se tornado figura bissexta nos palcos ao longo de mais de 60 anos de trajetória artística, Migliaccio se despediu da cena em 2017 juntamente com uma obra autoral, Confissões de um Senhor de Idade (2017), no qual comemorava 60 anos de carreira e realizava uma espécie de inventário de sua trajetória pessoal e artística num diálogo com Deus.

Formado dramaturgo entre 1958 e 1961, quando participou dos Seminários de Dramaturgia do Teatro de Arena, em São Paulo, Migliaccio (que compôs, no grupo, o elenco da mítica primeira montagem de Eles não Usam Black-Tie, de Oduvaldo Vianna Filho) assinou obras de pouca visibilidade fora do grupo e por muito tempo se manteve apenas como intérprete, entretanto seria interessante que suas obras fossem tiradas do baú da memória nacional.

Devoto das experimentações de Augusto Boal (1931-2009), o ator transformou suas experiências  visões de mundo em peças escritas através de sua interpretação da realidade e de passagens autobiográficas, seja em A Ocasião faz o Ladrão (1967) ou em Os Ratos do Ano 2030 (1999) – ambas montadas ao lado de sua irmã, Dirce Migliaccio (1933-2009) -, o ator imprimia passagens e sua vida ou as impressões que tinha a respeito da vida e do mundo.

Impressões estas que se desenvolveram em uma visão de mundo sardônica e sartriana que desaguaram em seu último espetáculo, o já citado Confissões de um Senhor de Idade, obra de tom (até) fatalista e que antecede outras obras do autor que seguem inéditas. Não tivesse saído de cena na manhã de segunda-feira, 04 de maio, Migliaccio talvez pusesse em cena peça com o retrato da sociedade em tempos de pandemia e crise política. As peças estão prontas,o que virá daí só o tempo dirá.

Contudo, é importante pensar que s obras dramatúrgicas de Flávio Migliaccio, eclipsadas por outros grandes títulos de seus colegas do Arena, merecem atenção e talvez possa gerar publicação de coletânea até então inédita e – possivelmente – impensada no mercado editorial. Quem viver…

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