Desde que foi convidado pelo ministro da Cidadania do governo do atual presidente da República, Jair Messias Bolsonaro, a assumir o cargo de diretor do Centro de Artes Cênicas Funarte, o diretor teatral paulistano Roberto Alvim viu seu nome estampar as principais manchetes dos jornais e portais. O motivo foi o polêmico post em seu perfil oficial no Facebook convocando artistas “conservadores” para a formação de uma “Máquina de Guerra” ideológica.
Tal convocação resultou na divulgação de uma série de comunicados oficiais de órgãos ligados a classe artística repudiando as ações do diretor. A última, até o momento, divulgada na tarde e quinta-feira, 20, foi da ASSERTE – Associação de Servidores da Funarte. Em carta aberta, a associação se dirige ao ministro da cidadania Osmar Terra num repúdio a nomeação de Alvim para o cargo.
A carta diz que a associação se viu espantada com as declarações de Alvim, que adjetivaram de “redutora” e “inaceitável” frente a uma ideologia pregada pelo diretor, também adjetivada de “primária” e “dicotômica” . O manifesto é encerrado com a denúncia do “uso do cargo público para disputa ideológica”. Procurado pela reportagem,Alvim não respondeu aos pedidos de entrevista até a publicação desta matéria. Leia na íntegra o comunicado da Associação de Servidores da Funarte:
Ao Presidente da Fundação Nacional de Artes, à comunidade das Artes Cênicas
e da arte como um todo, às cidadãs e aos cidadãos brasileiros,
A Associação de Servidores da Funarte – ASSERTE – vem a público manifestar
seu repúdio à indicação feita pelo Sr. Ministro da Cidadania, Osmar Terra, para a
direção do Centro de Artes Cênicas desta Fundação.
As recentes declarações feitas a veículos de imprensa pelo diretor de teatro
indicado para o cargo, Sr. Roberto Alvim, causam espanto. Em sua atuação, esta
instituição prima pelo respeito à pluralidade e liberdade das manifestações artísticas,
princípios coerentes com a natureza múltipla e variada das culturas que constituem a
nossa cultura nacional. Preocupa-nos, portanto, que a cruzada “conservadora” que este
senhor diz querer empreender afronte os direitos e garantias instituídos pela
Constituição Federal Brasileira, que determina: ninguém será privado de direitos por
motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política. Preocupa-nos que um
aspirante a cargo público manifeste intenção de favorecimentos ou discriminações desta
ordem (prática jamais observada na atuação da Funarte em toda a sua história) e que
afronte o objetivo primeiro do Plano Nacional de Cultura: o de reconhecer e valorizar a
diversidade cultural brasileira.
Gritante é o reducionismo da compreensão de Arte manifestada pelo Sr. Alvim
em suas declarações, atribuindo valores ao que chama de “arte de esquerda” e “arte de
direita”, convocando profissionais de teatro que se alinhem aos valores conservadores
para a criação de “uma máquina de guerra cultural”. É inaceitável que uma perspectiva
tão redutora sobre o fazer artístico, que o circunscreve a uma disputa ideológica
primária, dicotômica, se sobreponha à finalidade institucional e republicana da
Fundação, de implantação de políticas públicas democráticas, inclusivas e estruturantes
para o setor artístico.
Dessa forma, compartilhamos das preocupações manifestadas por outras
entidades do setor teatral, como a Associação de Produtores de Teatro do Rio de Janeiro
(APTR), a Associação de Produtores Teatrais Independentes (APTI), a Associação dos
Produtores de Espetáculos Teatrais do Estado de São Paulo (APETESP) e Cooperativa
Paulista de Teatro, e denunciamos o uso de cargo público para disputa ideológica,
prática especialmente danosa na esfera das políticas públicas para as Artes, que têm na
garantia da liberdade de expressão e da diversidade artística seus princípios basilares.
Associação de Servidores da Funarte – ASSERTE
Rio de Janeiro, 20 de junho de 2019